O desfile das escolas de samba são marcados pela alegria, irreverência e criatividade, mas também conta com suas tradições. Além da Velha Guarda e do respeito aos mais velhos, essas agremiações culturais possuem uma ala especial, que faz referência direta às matriarcas do samba: as baianas.
Crédito: Tata Barreto/ RioturElas são tão importantes que valem prêmio. Em 2024, a Ala das Baianas da Beija-Flor ganhou o Estandarte de Ouro do jornal O Globo. Surgida na década de 30, já foi um quesito de julgamento valendo ponto nos desfiles. Deixou de ser, mas, mesmo sem contar pontos, a ala é obrigatória e deve ter pelo menos 70 componentes. Conheça essa história.
Crédito: Reprodução de vídeo YoutubeEm 1933, o então prefeito do Rio, Pedro Ernesto. criou através de um decreto de lei a ala das baianas nas escolas de samba, em homenagem às “baianas do acarajé”, que estavam sempre presentes nas ruas e casas de santo do início do século XX.
Crédito: Arquivo NacionalNo início do século XX, o samba era considerado uma espécie de atividade criminosa, sendo marginalizado. Baianas como Tia Ciata organizavam festas em seus quintais onde os primeiros sambistas se reuniram. Ela era casada com um policial, o que blindava seu quintal da perseguição das autoridades.
Crédito: DivulgaçãoAs baianas até hoje representam também a força espiritual e religiosa que sempre esteve ligada aos das escolas. Com o tempo, elas passaram a ser compostas por mulheres mais experientes na comunidade da escola. Durante algum tempo, ela até foi quesito de julgamento. Contudo, mesmo depois de deixar de contar pontos, elas continuam sendo obrigatórias.
Crédito: Marcelo Gandra/Fotos PúblicasAlém disso, as baianas das escolas contribuem para a tradicional "Lavagem do Sambódromo", que acontece nos ensaios técnicos que antecedem os desfiles - uma semana antes. Nela, a pista é lavada com água de cheiro, ervas, incensos e arruda.
Crédito: Creative CommonsEste evento também conta com a participação de membros ligados a diversas religiões, que dão as bênçãos a todos com músicas, rezas e orações, além do cortejo com a imagem do padroeiro da cidade do Rio de Janeiro, São Sebastião.
Crédito: Jussara Razzé/Wikimédia CommonsO intuito do evento é abrir os caminhos para os desfiles e trazer sorte e vibrações positivas para as agremiações. Isso mostra a forte ligação das baianas e do mundo do samba com as religiões de matrizes africanas. Todos os anos, alguns enredos exaltam a cultura negra e as entidades e orixás da umbanda e do candomblé.
Crédito: Jussara Razzé/Wikimédia CommonsNo início dos primeiros desfiles das baianas, as fantasias eram compostas por uma saia rodada, uma bata, um pano de costas e o corpete. No entanto, a criatividade brasileira fez com que cada vez mais as baianas participassem do desfile de acordo com o tema que a escola faz no ano.
Crédito: Divulgação SecomAssim, é possível ver baianas vestidas das mais variadas formas, sempre com a saia rodada e algum adereço em suas cabeças. Com o passar dos anos, as fantasias das alas das baianas passaram a ser muito aguardadas nos desfiles. Os carnavalescos dão uma atenção especial para a roupa destas senhoras, que representam por si só a história do samba.
Crédito: Marco Antonio Cavalcanti/ RioturPor volta de 1870, na região do Cais do Porto, no Rio de Janeiro, moravam muito negros forros vindos da Bahia. Entre eles, as tias baianas que eram, em sua grande maioria, mães de santo e também cozinheiras e quituteiras.
Crédito: Tomaz Silva/Agência BrasilElas vendiam seus produtos caracterizadas com seus trajes típicos que são compostos pelo torso, a bata, o pano da costa e a saia rodada. A origem dessa vestimenta remonta às escravas que se enfeitavam para as procissões de rua e cultos de religiões de matrizes africanas.
Crédito: Flickr/Bruno ViterboNas religiões africanas, baianas participavam sempre dando o toque especial à culinária e à música. Foi nessas reuniões que nasceu o samba. O Carnaval carioca surgiu também de festas como os folguedos de coroação dos reis congos e os cucumbis (folguedo banto) no Rio de Janeiro.
Crédito: Flickr/Pablo SouzaAos poucos as celebrações exclusivas do povo negro foram sendo desvinculadas das cerimônias do catolicismo e mudadas para o período do carnaval. Surgiram, então, os cordões cariocas, cheios de brasilidade e os ranchos, que eram cortejos que influenciaram as futuras escolas de samba nascidas nos morros e subúrbios do Rio.
Crédito: Valéria del Cueto/RioturAs escolas de samba são a principal vitrine cultural e turística do carnaval brasileiro. Elas nasceram a partir do rancho carnavalesco. Em 1893, foi criado o "Rei de Ouros", por Hilário Jovino Ferreira. Ele apresentou novidades como o enredo, personagens como o casal de mestre-sala e porta-bandeira e o uso de instrumentos de cordas e de sopro.
Crédito: Reprodução Facebook Unidos do PerucheOs sambistas do Morro de São Carlos, no Estácio, fundaram a Deixa Falar, em 1928, com as bases das atuais escolas de samba. Entre eles, estava Ismael Silva com a ideia de criar um bloco carnavalesco diferente, que pudesse dançar e evoluir ao som do samba.
Crédito: Flickr/Marcelo MessinaNos anos seguintes, em 1929, o primeiro concurso de sambas, realizado na casa de Zé Espinguela, onde saiu vencedor o Conjunto Oswaldo Cruz, e do qual também participaram a Mangueira e a Deixa Falar.
Crédito: Jussara Razzé/Wikimédia CommonsEntre 1930 e 1932, o periódico Mundo Sportivo, de propriedade do jornalista Mário Filho (irmão do dramaturgo Nelson Rodrigues), decidiu organizar o primeiro Desfile de Escolas de Samba, na Praça Onze. O jornal, inaugurado no ano anterior por Mário Filho, com o término do campeonato de futebol, estava sem assunto e perdia leitores. O jornalista Carlos Pimentel teve a ideia dos desfiles.
Crédito: Claudio Lira/ LIESSPA tradicional "ala das baianas" era pré-requisito para concorrer, sendo que as escolas, todas com mais de cem componentes, deveriam apresentar sambas inéditos e não usar instrumento de sopro, entre outras exigências. O julgamento foi elaborado pelo jornal na época e tornou-se um sucesso.
Crédito: Reprodução de vídeo TV GloboCom a ascensão do nacionalista Getúlio Vargas, e a fundação da União Geral das Escolas de Samba, em 1934 — ainda que a marginalização do samba persistisse por algum tempo — as escolas de samba começaram a se expandir e a ganhar importância dentro do carnaval carioca, suplantando os ranchos e as sociedades carnavalescas na preferência do público, até que estes viessem a se extinguir
Crédito: Reprodução Facebook PortelaO recifense Pedro Ernesto, quando prefeito do então Distrito Federal, tornou-se o primeiro político a dar apoio financeiro ao carnaval, dentro de um projeto que visava transformar o Rio de Janeiro numa potência do turismo, e em 1935 reconheceu e oficializou os desfiles.[
Crédito: Henrique Matos/RioturA figura da baiana teve um dos seus nomes mais importantes no início do século XX. Trata-se de Hilária Batista de Almeida, conhecida como Tia Ciata, uma das figuras mais influentes para o surgimento do samba carioca. Também iniciada no candomblé em Salvador por Bamboxê Obiticô e era filha de Oxum.
Crédito: Reprodução Youtube e Domínio Público/Wikimédia CommonsTia Ciata se tornou a grande dama das comunidades negras no Brasil pós-abolição e uma das principais incentivadoras do samba depois de abrir as portas de sua casa para reuniões de sambistas pioneiros quando a prática ainda era proibida por lei.
Crédito: Flickr/Maria Adelaide SilvaNa juventude, já participava da fundação da Irmandade da Boa Morte em Cachoeira, município do Recôncavo Baiano. Mas Foi a mais famosa das tias baianas (na maioria ialorixás do Candomblé que deixaram Salvador para a capital carioca por causa das perseguições policiais e conheceu o samba de roda, que era marginalizado na época.
Crédito: Reprodução Instituto Moreira SallesCiata teve de trabalhar como quituteira para ajudar em casa e sustentar os 14 filhos que teve com João Baptista da Silva, funcionário público. Paramentada com turbantes na cabeça e volumosos vestidos brancos, foi uma das precursoras do movimento de tias baianas quituteiras na Cidade Maravilhosa.
Crédito: Divulgação SecomPor meio de mandingas e tabuleiros repletos de bolos, manjares e cocadas, a atuação das tias quituteiras foi fundamental para garantir a manutenção da cultura popular trazida da Bahia e dos ritos de tradição africana, além do sustento de suas famílias
Crédito: Ministério da CulturaCom a culinária e círculos sociais impulsionados por expressões musicais, a residência de Ciata ganhou destaque. Era situada na antiga Rua Visconde de Itaúna, adjacente à Praça Onze, também reconhecida como "Pequena África". Rapidamente ascendeu como um dos principais epicentros de encontros de personalidades do samba carioca, como Pixinguinha, Donga, Heitor dos Prazeres, Sinhô e João da Baiana.
Crédito: Flickr/pedrofernandes.As "rodas de samba" eram eventos habituais, nos quais os indivíduos mais experientes congregavam-se na sala principal, entoando canções de forma retumbante, enquanto os mais jovens ocupavam outros compartimentos, entoando o samba corrido. No pátio, ficavam aqueles que apreciavam a percussão ritmada.
Crédito: Flickr Celso AkinNaquela época, as reuniões de samba eram proibidas pela polícia. Entretanto, para os encontros na residência de Tia Ciata, as autoridades fechavam os olhos, em virtude da sua reputação como curadora. O primeiro samba gravado no Brasil Pelo Telefone, de autoria de Donga e Mauro de Almeida, foi composto na casa de Tia Ciata, em um dos vários encontros que aconteciam, entre o final de 1916 e o começo de 1917
Crédito: Rafael Moraes/ RioturPor incentivo do pai de santo Bamboxê Obiticô, que era africano, Hilária foi iniciada no candomblé e se tornou mãe de santo, sendo confirmada como Ciata de Oxum. Como muitos outros afro-brasileiros da época, Tia Ciata manteve sua fé em segredo por muitos anos, devido à discriminação e ao estigma associados às religiões africanas no Brasil
Crédito: Flickr/MònicaA confecção das roupas das baianas tornou-se uma indústria do carnaval que é uma das maiores fontes de emprego tanto para os componentes das escolas como para os profissionais contratados pelas escolas. A confecção de fantasias e alegorias gera empregos nos barracões das agremiações.
Crédito: Tim Fearn/Wikimédia Commons