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Cultura

Tristão de Athayde homenageia a mulher brasileira através de quatro autoras de seu universo literário

Considerada ponto de interrogação, Clarice Lispector se correspondia com o intelectual através de dedicatória em seus livros

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Foto Destaque: Divulgação

Serão apresentadas na série de palestras e na mesa redonda da “Jornada Tristão de Athayde”, organizada pelo Instituto Afranio Affonso Ferreira, histórias que ajudam a definir a mulher brasileira como uma mescla de sensibilidade, delicadeza, força, determinação e resistência. Nesta sétima edição, no dia 27 de julho, às 19h, a jornada vai promover um “diálogo” entre Tristão de Athayde – pseudônimo adotado por Alceu Amoroso Lima- com mulheres autoras como Clarice Lispector, Heloísa Buarque de Hollanda, Lúcia Miguel Pereira e Laís Corrêa de Araújo.

O intelectual e crítico literário Alceu Amoroso Lima se referia à escritora Clarice Lispector, como um ponto de interrogação na literatura brasileira. Ele que manteve contato com a escritora através de mais de 32 mil cartas ao longo da vida. Mas, de maneira inusitada, por meio de dedicatórias nos livros que a escritora lançava e enviava para ele, a partir do final dos anos 1940. E conforme a relação entre os dois crescia, o enigma Clarice só aumentava. Tanto que na dedicatória em seu único livro de contos eróticos – “A Via Crucis do corpo”, de 1974 – Clarice pediu ao intelectual que não lesse a obra.

Cartas trocadas (Foto: Reprodução/Divulgação)

Como Tristão de Athayde, Alceu guardou um vasto acervo literário e manteve contato com os principais escritores, intelectuais e pensadores do século XX. Seu acervo conta com mais de 32 mil cartas e incontáveis textos inclusive jornalísticos, que formam um panorama da sociedade da 1ª Guerra Mundial ao início dos anos 1980. Alceu faleceu aos 89 anos, em 1983.

Através dos pesquisadores Leandro Rodrigues (Clarice), Selene Dias (Laís) e Guilherme Arduíni (Lúcia) e da escritora Heloísa Buarque de Hollanda, recém-nomeada para a Academia Brasileira de Letras (ABL), a jornada vai mostrar a relação do crítico literário com o universo feminino representado por essas personalidades. A abertura da jornada ficará a cargo do organizador do evento Xikito Ferreira, escritor e neto do intelectual. Por meio de correspondências, entrevistas, críticas literárias e – no caso de Clarice Lispector – dedicatórias trocadas com Tristão, os pesquisadores irão relatar curiosidades, peculiaridades e destacar a importância do trabalho dessas mulheres na literatura brasileira.

“Tristão chegou a fazer as críticas dos primeiros romances de Clarice, há registros sobre sua narrativa diferenciada e sondagem existencial. Houve uma troca literária entre eles, mas não há uma única carta trocada entre eles. A correspondência com ela se dava de forma mais livre, nas dedicatórias”, conta o pesquisador Leandro Rodrigues.

Já através das mais de 30 cartas trocadas com Tristão, a professora Selene Dias vai contar um pouco da trajetória da poeta, crítica literária e cultural mineira Laís Corrêa de Araújo. Biógrafa do poeta Murilo Mendes, Laís discutia em suas cartas com Tristão muitas questões sobre literatura nos anos 1960 e também sobre as agruras do período da ditadura. Uma das mais importantes críticas de sua geração, Laís resistiu a perseguições, sequestro e até ameaças de morte pela Polícia do Exército, sempre mostrando a força do seu trabalho.

O pesquisador Guilherme Arduíni vai apresentar o trabalho da primeira mulher a se destacar como crítica literária, função até então só exercida por homens. Lúcia Miguel Pereira, primeira grande biógrafa de Machado de Assis e uma referência no ensaísmo nos anos 1930/1940, foi também pioneira ao escrever para a revista “A Ordem”, editada por Alceu, seis crônicas da condição feminina que estava em transformação depois das duas grandes guerras mundiais.

Em seu trabalho, Lúcia retrata o momento em que a mulher deixa de exercer somente o papel doméstico de mãe e esposa e passa a trabalhar fora. Ou seja, o início da percepção do que hoje é chamado empoderamento feminino, quando a mulher passa a exercer papel importante nos espaços públicos e começa a perceber e lutar por seus direitos na sociedade. Em sua correspondência com Tristão, ela buscava apoio, conhecimento e aconselhamentos do intelectual, a quem tinha como mestre. O intelectual via em Lúcia “a grande intelectual do momento” e chegou a dizer que ela deveria ocupar uma cadeira na ABL.

Recém-nomeada para a ABL, a escritora, crítica literária e professora Heloísa Buarque de Hollanda, autora do documentário “Dr. Alceu”, de 1981, vai contar um pouco dos bastidores da realização deste trabalho e da convivência com o intelectual, de quem foi aluna na faculdade.

“Alceu é presença. O documentário é uma retrospectiva e mostra o papel dele na cultura brasileira, uma fonte de conhecimento sobretudo sobre o Modernismo, da literatura, mas também um pensador que denunciava e discutia os horrores da ditadura. Ele deixou toda essa experiência de quase um século de História, um legado maravilhoso”, disse Heloísa Buarque de Hollanda.

A sétima edição da “Jornada Tristão de Athayde” volta a ser realizada este ano pela internet, no dia 27 de julho, às 19h, no YouTube. Os palestrantes terão 15 minutos de explanação, cada. E depois será aberto um debate com a participação do público.

Os encontros da “Jornada Tristão de Athayde” têm como principal objetivo manter vivo o legado de Alceu Amoroso Lima. De incentivar o diálogo entre os estudiosos, a partir de ideias e obras do autor sob os mais variados aspectos.