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Apple TV+: quando qualidade não é suficiente para conquistar o público

Com acervo limitado e público reduzido, o serviço enfrenta desafios para se consolidar no mercado de streaming, mesmo após investimentos bilionários

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As produções do Apple TV+ primam pela qualidade em detrimento da quantidade

De acordo com o portal Meio Bit, a Apple descobriu, da pior maneira possível, uma das regras não-escritas do entretenimento: nem sempre é possível garantir audiência apenas com dinheiro.

O serviço Apple TV+, introduzido em 2019, foi uma aposta ousada da maçã para garantir um lugar ao Sol no mercado de streaming, com a estratégia “menos é mais”: obras selecionadas a dedo, produtores e diretores consagrados, atores e atrizes de primeira linha, tudo regado a um gigantesco investimento, de US$ 20 bilhões em 5 anos.

Como resultado, o Apple TV+ possui um acervo de filmes e séries originais bastante elogiado, abocanhou vários prêmios e indicações da crítica especializada, mas quando o assunto é o público espectador, o serviço fica muito atrás dos líderes Netflix e Amazon Prime Video, e perde até para concorrentes menores.

O último Emmy Awards, a mais importante premiação do mundo para produções e profissionais da televisão, ilustra bem esse paradigma: as obras do Apple TV+ receberam um número recorde de indicações, 72 no total, divididas entre 16 obras diferentes, e levaram 10 prêmios para Cupertino, incluindo uma segunda premiação para The Morning Show, a comédia produzida e estrelada por Jennifer Aniston e Reese Whiterspoon, e a primeira de Slow Horses, uma série de espionagem e humor negro estrelada por Gary Oldman, que sozinha recebeu 10 indicações.

Desde o início, a Apple entendeu que não teria como competir de igual para igual com a Netflix, e ao invés de apostar na quantidade, mirou na qualidade, apoiando-se exclusivamente em seu caixa abarrotado de grana. O pensamento era simples: ‘nós vamos produzir os melhores filmes e séries que o dinheiro pode comprar’, e tratou de recrutar só pesos-pesados, como os diretores Martin Scorsese, Steven Spielberg, e M. Night Shyamalan, e os produtores David S. Goyer (trilogia Batman do Nolan, O Homem de Aço, Batman vs. Superman, trilogia Blade) e Bryan Fuller (Star Trek: Deep Space Nine, Voyager e Discovery, Pushing Daisies, Hannibal, Deuses Americanos).

A brincadeira obviamente saiu cara. De início a Apple injetou US$ 1 bilhão, só a primeira temporada de The Morning Show, uma das séries mais caras da primeira leva, custou US$ 12 milhões por episódio, boa parte da grana reservada aos cachês de Aniston e Whiterspoon; a primeira temporada de Fundação, embora um desbunde visual, custou US$ 45 milhões, ou US$ 4,5 milhões/episódio, um valor alto, mas “um pouco” mais pé-no-chão.

Claro, houve problemas. Sendo uma companhia notoriamente carola, a Apple tentou fazer do Apple TV+ um serviço onde sexo, palavrões, drogas, violência, e referências a religião, não tinham vez; Fuller, por exemplo, foi demitido porque a maçã achou que a nova versão de Amazing Stories estava ficando “dark demais”. Temas sensíveis, como sátiras e críticas, mesmo que leves, a movimentos pró-DEI (Diversidade, Equidade, e Inclusão), também foram banidos.

O CEO Tim Cook cancelou pessoalmente duas séries, uma biografia do rapper e produtor musical Dr. Dre, ao descobrir que ela viria recheada de conteúdos comuns ao estilo tough life do gangsta rap, e outra sobre o portal Gawker (Gizmodo, Kotaku, Jezebel, etc.) durante a era Nick Denton, que tentou tirá-lo do armário antes do executivo assumir publicamente que é gay; Cook sequer sabia que a série estava em produção.

E não esqueça daquele episódio do protótipo de um iPhone 4 “encontrado” em um bar em abril de 2010, meses antes do lançamento oficial, publicado originalmente pelo Gizmodo. Jobs ficou possesso na época, e o site acabou banido do keynote.

O foco da Apple em qualidade teve um preço, o acervo do Apple TV+ é bem limitado, apenas 259 séries e filmes; a título de comparação, a Netflix tem um catálogo de mais de 18 mil produções, e o Prime Video, mais de 25 mil. Isso ressoa fundo nos ouvidos do público, que consideram o valor da assinatura alto para um portfólio “magro”, com poucas opções de escolha, e não importa o quão premiadas e elogiadas pela crítica as obras sejam.

A Apple e outros serviços não divulgam os números exatos de audiência, mas é possível fazer algumas projeções, como a mais recente do Instituto Nielsen: em junho de 2024, o serviço teria alcançado apenas 0,3% de todas as visualizações de produções de TV nos Estados Unidos, o que é um número ridículo. Segundo a empresa de análise Strategic Guy, o serviço de streaming tem apenas 20 milhões de assinantes no país, que é uma marca muito baixa, quando comparada com Netflix (84,8 milhões, dados de outubro de 2024, reunindo EUA e Canadá), e Prime Video (180 milhões, dados de 2024, apenas EUA), ainda que o Amazon Prime pese muito aqui.

A coisa está tão feia, que mesmo serviços considerados menores e de nicho, como Paramount+ (72 milhões) e Peacock (28 milhões), têm mais público nos EUA que o Apple TV+.

Como resultado, a Apple construiu em 5 anos um serviço com obras de primeira, mas que ninguém assiste. Agora veio a conta, o SVP de Serviços Eddy Cue estaria orientando produtores a “pegarem leve” com o orçamento, e a empresa teria posto em prática um plano para licenciar filmes para terceiros (séries ainda não), e oferecer bundles de assinaturas, algo que a maçã era avessa, atados a planos de dados de operadoras; a Comcast já tem um desses.

A Apple também estaria revendo seu plano de lançar filmes no cinema, diminuindo o número para controlar gastos, e, ao mesmo tempo, estaria considerando reconsiderar sua estratégia de preço baixo de assinatura e experiência sem anúncios, algo que todos os concorrentes abriram mão, em prol de aumentar a receita; o problema, os assinantes do Apple TV+, que já não são muitos, provavelmente não vão engolir a mudança, o que pode acabar com uma diminuição significativa do público.

O que podemos dizer, é que a alternativa mais simples, focar em quantidade, não faz o estilo da Apple, que preferirá continuar entre a cruz e a espada, se isso significar sacrificar a qualidade de suas obras, tudo em nome do mantra da empresa, de sempre oferecer melhores produtos que a concorrência.

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